No Chão da Escola: Fernanda Vasconcellos, crença na utopia e pé na realidade

“O chão da escola é cruel. As políticas públicas precisam garantir aos professores espaços acolhedores e tempo de estudo e troca”

Fernanda: “O que me faz permanecer: há muito para entender e transformar” | imagem: acervo pessoal

Quando Fernanda contou que se tornaria professora, seus amigos do mundo teatral torceram o nariz: diferente dos palcos, as salas de aula seriam algo como uma prisão. Mas o que ela vivenciou foi o contrário disso: “Aos poucos fui me sentindo tão realizada e provocada pelos desafios da educação que ganhei o respeito deles como educadora – e também dos meus colegas do atual ofício”. Seu percurso começou em 2007, como professora de educação básica em arte na rede de ensino de Taubaté (SP). Hoje, após ter participado da reformulação do currículo dessa cidade, atua, nela, na formação de professores de arte e é também formadora do projeto Comunidade de Aprendizagem.

Graduada em Educação Artística com ênfase em Artes Cênicas pela Faculdade Santa Cecília e mestranda em educação na área de Currículo, Formação e Práticas Pedagógicas da Universidade de São Paulo, Fernanda traz na entrevista abaixo suas perspectivas sobre a educação, e sugere que a escola precisa, a um só tempo, de utopia e realismo, sonho e teoria, atenção e mão na massa.

O que te atraiu para a educação?

Desde que comecei a pensar em profissão, nunca quis ser professora. Sempre quis ser atriz. Quando tinha cerca de 25 anos estava na organização de uma colônia de férias e uma amiga educadora me disse que eu pensava como professora. Foi o início. Diante da dificuldade de colocação profissional na área artística fiz licenciatura em artes apenas para ter a profissão de professora como opção. Passei em um concurso público no final da graduação e trabalho na área desde então.

Algo já te tentou a deixar a educação? O quê? O que te faz permanecer na educação?

Meus colegas de teatro, no início, tentavam. Achavam que a educação aprisiona, em comparação com a liberdade da criação artística. Mas aos poucos fui me sentindo tão realizada e provocada pelos desafios da educação que ganhei o respeito deles como educadora – e também dos meus colegas do atual ofício. E é isso que me faz permanecer: há muito para entender e transformar.

Às vezes os professores criticam certas opiniões sobre a escola indicando que os críticos não conhecem o “chão da escola”. Como você define esse chão da escola? O que ele tem de particular?

O chão da escola é cruel. Como a escola é o reflexo da sociedade, além de ser também responsável pela sua manutenção, os problemas desta se revelam naquela. As relações com o tempo e com a comunicação são deficitários e, consequentemente, as relações que deveriam ser a fonte da transformação da informação em conhecimento fica prejudicada. Nesse sentido, os professores se sentem muito solitários, e as teorias parecem muito distantes, pois não há espaço para compreendê-las.

Ainda nesse sentido, o que as políticas públicas ou as ações dos governos poderiam entender melhor na abordagem das questões escolares?

O professor precisa de tempo e espaço e as políticas públicas de formação precisam garantir isto. Tempo de qualidade para estudo, sem que todo o tempo esteja tomado por ações dirigidas, permitindo trocas livres entre os pares. E os espaços precisam ser acolhedores, tanto arquitetonicamente – considerando aspectos como temperatura e som, que nem chegam a ser discutidos –, quanto afetivamente ou em âmbito relacional.

O que é ser uma educadora?

Ser educadora é acreditar na utopia, mas mantendo os pés bem fincados na realidade. E ter os sonhos na alma, as teorias na mente e os olhos e mãos no contexto em que se trabalha.

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