Existe Filosofia Europeia? | Sim! E sem ela nós não seríamos absolutamente nada!

Um diagnóstico correto mediante uma resposta inequivocamente errada

imagem: Augusto Grossi/rawpixel.com

Existe filosofia europeia? (Apenas respostas erradas) é um fórum com vistas a outros modos de ver a história da filosofia. A chamada de textos está aberta. Saiba mais sobre a proposta e envie o seu texto.


“O tempo é curto, vamos aproveitar o tempo.”

 – Fred Hampton

 Sim! Existe filosofia europeia e é justamente a filosofia europeia que sustenta inequivocamente uma hierarquia, que sem ela seria improvável de se erigir quaisquer processos educacionais de pesquisa e de sucesso acadêmico (pois é só o que importa) mediante projeto de existência de vida considerada digna.

O que seria de nós sem a leitura estrutural de um texto movido hegemonicamente por parâmetros fundamentados por este tipo de tradição?

Sim! Existe filosofia europeia e sem ela nós não seríamos absolutamente nada!

Veja também:
>> “Existe filósofos no Brasil?“, por Lucas Nascimento
>> “A imaginação brasileira“, por Graça Aranha

Não seríamos capazes de filosofar, de ler um texto, seríamos incapazes de interpretá-lo.

É a filosofia europeia que nos coloca no lugar onde devemos estar, no lugar de humildade e subserviência inequívoca, quem somos nós para quereremos filosofar para além dos parâmetros europeus?

Qual filosofia poderia nos alertar mais inequivocamente para nossa incapacidade de criar?

Criar só nos parâmetros dissolutivos (diferença até certo ponto) europeus, é claro!

Pois tudo que existe fora disso é simplesmente reação, é abstrato, é delírio é anti- metodológico!

Somos programados a assumir esta alcunha cognitiva de inferiorização e devemos nos orgulhar disso, pois que privilégio o nosso! (sul- americanos, panafricanos, povos ancestrais, autóctones e afins)

Somos livres para criar sim! Mas nos parâmetros europeus!

Remetemos aqui a máxima de Lacan quando perguntado sobre o inconsciente:

– Como era antes do inconsciente ser analisado?

– Bem, era a mesma coisa!

Não! Não! Senhores! Nada seria a mesma coisa antes de uma subserviência metafisica europeia.

Seríamos incapazes de viver e de implicar sentido a miserabilidade de nossas vidas.

Sequer seríamos capazes de respirar… ah! O ar ruim… o ar ruim… como disse Nietzsche, seria o ar que respiraríamos.

Fomos salvos! Salvos pela filosofia europeia! Finalmente redimidos, ó bela redenção!

Salvos pela hermenêutica estrutural europeia, glória! Sem ela seriamos incapazes de dizer algo que tivesse sentido.

Como poderíamos interpretar (e viver) sem Schleiermacher? Sem Gadamer? Sem Heidegger? Sem Freud? Sem Saussure?

Antes sequer tínhamos cérebro, passamos a ter cérebro (bem mapeado, demarcado, diagnosticado, tornado molar) é claro pela psiquiatria e psicologia dominantes), consciente, inconsciente, racionalidade, civilidade e cidadania! Que maravilha!

Fomos acoplados! Finalmente conectados! Agora somos úteis! Produtivos! Livres para sermos humilhados e redimidos pela filosofia europeia!

Chama-se liberdade para correr atrás de migalhas de civilidade (enquanto subjetivação) demandadas pela filosofia ou pelo processo de formação acadêmico europeu!

Sabia bem disso Deleuze na França e jogou o jogo que tinha de ser jogado, o jogo da simulação do intelectual europeu! Para ter o direito de ser levado a sério, as vezes até a sério demais. (ou ainda hoje não em certos centros que cultuam um certo filosofo de konisgberg direta ou indiretamente).

Agora sim somos livres para nos explorarmos através de simulações contínuas de intelectualidade europeia.

Diante pressupostos lógicos hegemonicamente concebidos de maneira substancial- fundacionista, mediante um simbolismo lógico que se utiliza de concepções indexicais (indicativas-locais) mas que ignora o espectral (no sentido de Derrida em espectros de Marx , não a toa dois europeus) como constituinte alargado de suas simbolizações(materiais) e hierarquizações em ternos de significados e significantes, mediante uma certa ideia de linguagem irremediavelmente gramaticalizada ( fora disso não há linguagem possível).

Linguagem europeia no parágrafo anterior? Ininteligível? Sim, é o que nos resta para sermos civilizados academicamente falando.

Mas também depende. Depende de que? De quantos acadêmicos bem localizados tenham ao seu redor para te chamar de abstracionista, pois dependendo da cadeia de distribuição hierárquica (herdada do formalismo acadêmico europeu) você pode ir muito facilmente de alguém ineficaz (não acadêmico) para alguém rebuscado demais como modo operacional e bastante eficiente de exclusão.

Eis o modo de separação (alienação) acadêmico ligado ao filosofar europeu.

Eis a grande e admirável fluidez da filosofia europeia (máquina).

A europeização da filosofia é responsável por nos impedir de devorar, (Viveiros de Castro) e está mais que certa.

Resumamo-nos a assumir a aparência de discurso crítico como duplicação das imagens (espetacularização como disse Debord, outro europeu) onde a separação consumada será universalizável mediante aspectos separados de disciplinaridades e de epistemologias, métodos de pesquisa que se auto validam e colonizam os saberes.

Eis a especialidade de toda a filosofia (e da ciência europeia)

Sim! Existe filosofia europeia e o realizar histórico (dialético) da filosofia não passa pelo continente africano, pois este em seus sentidos civilizatórios amplos são perturbadores demais (anti-teleológicos demais) para nosso senso formativo produtivo de uma filosofia legitimamente europeia!

De uma identidade acadêmica sul-americana-europeia

Não há metafísica europeia que pare de pé mediante o resgate daquilo que chamarei aqui de epistemologias africanas, dialéticas- africanas (pra citar algumas figuras inassimiláveis, Exu, Yansã, ogum) ou processos de saberes e civilidades sul-americanas, ameríndias, ancestrais- indígenas e anticoloniais em sentido amplo.

E sem metafísica europeia o que seria de nós? O que seria da filosofia? Se desmancharia no ar?

Não, meus caros! É necessário manter o simbolismo (hegemônico) que agora já transita para sustentabilidade do neo-colonial que se dissolve para permanecer o mesmo!

É necessário performar abstrações de inserção dentro do filosofar acadêmico (majoritariamente europeizado fazendo o filosofar europeu parecer “decolonial” (termo usado aqui não à toa).

Nos tornaremos supostamente inclusivos para performar as universalizações do separado disciplinar com ares de transdisciplinaridade pois o conteúdo não se torna eficaz de fato quando a forma acadêmica civilizatória permanece a mesma.

Por isso não importa o conteúdo, a forma acadêmica e filosófica, ela continuará a ser europeia.

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