Além do que os olhos podem ver: entre o mar e a areia

Na estreia da série Orun-Aiyê, Anna Carolina Bueno (Ina Okun) reflete sobre memória e natureza

Antes de começar, peço licença ao dono da encruza, aos orixás, aos ancestrais e a todos que me guiaram até aqui. A jornada da vida tem sido repleta de aprendizado, ativações, erros e acertos. Um mundo de possibilidades.

E é nessa jornada que eu me encontro.

Para entrar/entender essa realidade, essa cosmovisão, é necessário descolonizar o olhar e compreender que o homem não contém toda a sabedoria. Existem muitos mistérios e segredos acerca da vida e da natureza que não podem ser explicados pelo homem ou pautados pela racionalidade – aquela que só vê o que está à frente, visível, palpável, desvinculada da espiritualidade.

Não é fácil falar ou escrever sobre algo que antecede a própria existência, que está presente desde a fundação do mundo, arraigado na terra, nas plantas, no corpo, em todos os seres. No entanto, aprendi com Exu, meu Babá, a Egbe e os ancestrais sobre a importância do compartilhamento e da troca de saberes para movimentar as estruturas internas e externas; transformar.

A memória é viva. A natureza é viva.

Frame do vídeo-poema “Se eu soubesse nadar” | imagem: Anna Carolina Bueno

 O mar, assim como toda criação, é vivo, tem memória, história e identidade. O mar presenciou o nascimento e a morte do homem, migrações, conflitos, afetos, tudo o que já aconteceu na terra e no céu. 

Além do que os olhos podem ver: ondas, correntes marítimas e marés. O imenso mar azul contém segredos em suas profundezas, um lugar de cura e também de dor.       

Dor daqueles que foram arrancados de sua terra, dos que tentaram atravessar devido aos conflitos territoriais e de todos que perderam sua vida durante a travessia. É também um espaço de cura, cura para quem procura refúgio e acalanto: a grande mãe, dona do mar, acolhe, cuida e se envolve. 

O mar é muito mais do que vemos, sentimos e sabemos.

Esboço para pintura
sem título, esboço para pintura | imagem: Anna Carolina Bueno

É um mistério profundo.

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Este é o primeiro texto da série Orun-Aiyê, que busca trazer reflexões sobre a vida e o mundo espiritual. Compartilharemos itans, saberes, poesia e algumas experiências pessoais nas entrelinhas

Autor

  • Comunicóloga, fotógrafa e artista visual, “carrega a palavra e a ancestralidade no peito / a força dos homens e das mulheres / e o desejo constante de compartilhar histórias”. 

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