O Colo Invisível

Passamos de colo à colo durante nossas vidas, do familiar ao espiritual, quem sabe via o existencial e até o niilismo – sim, acredito que possa existir abrigo no ateísmo tambem.

Os colos não são apenas os de familiares quando somos pequenos, mas aqueles abrigos breves que nos amparam na vida adulta também. De Papai Noel a Jesus, ou Nossa Senhora a Deus, Allah, Jeovah, Céu, paraíso. Mantras, túnicas, nuvens fofas e brancas, contrapoem o peso das obrigações diárias e da religião em si. Quando visitava igreja quando criança, a única coisa leve era o som – invisível. Vozes ecoando pela arquitetura oportuna.

O ouro, madeira, flores, gesso, barro, bancos, altar, vermelho, roxo, azul, vidro. Tudo pesado. feridas, calamidades, até os anjos são visíveis com seus ganchos atracados às nunens pintadas. Tudo pesado. O que é que buscamos nesse espetáculo? As lentes de Fellini não distorceram a realidade da fé. A fé é absurda, ou melhor, expõe a absurdez da condicao humana.

Somos animais por vezes conscientes da vida e da sua temporariedade. Leões e pombos não passam seu tempo pensando em velhice, nem tentando cobrir os cabelos grisalhos. Flamingos não ponderam sobre os motivos ou intuito de estarmos aqui nem porque são cor-de-rosa.

Sabemos que para espécies não humanas o tempo como conhecemos e com o qual mal nos damos não existe. Podem até existir sentimentos claros, somos vivos, elefantes e carneiros choram diante da morte, assim como focas velando sobre as carcassas de outras despidas de sua pelúcia fofa e branca.

Humanos tentam fazer sentido do mundo. E simultaneamente tentamos escapar de tudo o que queremos tao desesperadamente entender. Álcool, drogas, Bíblia e telenovelas, livros de Filosofia, volumes de enciclopédia, caixa de bonbons, tudo isso coexiste para preencher o espaço que a religião sempre tentou mapear, mas o mapa, como uma mandala tibetana, sempre desaparece com um sopro. Nunca será possível fazer autópsia em anjos, e isso faz dos anjos criaturas inquestionáveis – o gancho da fé é poderoso e invisível.

 

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