José W.M. Pires, o Pipol, do Cronópios

“Editamos o portal com intuição. Não existe ‘ciência literária’ no nosso caso”

José W.M. Pires, o Pipol, é editor-fundador do portal de literatura e artes Cronópios, focado na publicação de críticas, entrevistas, podcasts e contos, poesias, crônicas da “novíssima” produção da literatura brasileira. São mais de mil novos autores publicados, cerca de duas milhões de page views mensais e uma série de projetos paralelos, como a TV Cronópios, o Cronopinhos e a revista Mnemozine, além de parcerias com o grupo de artes cênicas on-line Teatro para Alguém e o programa de rádio Perfil Literário. Pipol fala à Capitu sobre a falência do jornalismo cultural impresso (“mesmice competente”) e sobre as possibilidades imensas da internet (“somos construtores de espaços e mundos”). Além disso, o Cronópios e seu modo de produção: novo site, sustentabilidade financeira e o critério acima de todos os outros: a criatividade. “Para mim, é a palavra mágica…”, diz Pipol.

Leia abaixo as respostas de Pipol, divididas por tópicos.

Cronópios

O Cronópios é um portal para a literatura e todas as outras artes. É um lugar virtual, um ponto de encontro. Sempre foi assim, construímos o site com isso em mente. Estamos há quase seis anos no ar e mais de mil autores já tem textos publicados no site. É um espaço que tem como meta também publicar muitos autores novos e de todos os cantos do país. Fazer o projeto, desenhar as páginas e cuidar de todos os detalhes para colocá-lo no ar foi e continua sendo um trabalho muito gratificante. Desde os primeiros momentos, o projeto foi muito bem recebido pela comunidade de autores e leitores. Comemoramos recentemente os nossos dois milhões de páginas acessadas por mês. É um número bom, mas é possível crescer muito mais, acredito.

E o site só funciona por conta de seus usuários, pois o formato de participação é colaborativo, não envolve remuneração. Gosto de dizer que com a internet ganhamos mais que dinheiro.

Público

O público do Cronópios é formado basicamente por autores, muito mais do que apenas leitores. O site é um ponto de encontro de escritores, em particular, e de artistas de todas as áreas. É um “barzinho” para troca de experiências, mostrar trabalhos seus e conhecer o que outros criadores estão fazendo. Além disso, também temos o papel de motivar a criação. Nós estamos sempre propondo projetos e atividades para surpreender e motivar o usuário. Sobre o perfil detalhado desse usuário do Cronópios, não temos dados com valor estatístico. Apenas sabemos que são pessoas criativas, que buscam o novo e que se autodenominam “cronopianos”. Uma grande e positiva surpresa para nós.

Publicação da “novíssima literatura brasileira”

Os critérios para publicação serão sempre a originalidade e a criatividade. Nenhum assunto pode ser proibido se for criativo e original. O Cronópios mesmo é um site criativo e gosta de companhia criativa. Estou repetindo muito essa palavra, mas ela é muito importante. Eu quase não vejo um critico literário escrever que tal autor é “criativo”: deve parecer pueril para eles usarem a palavra “criatividade”. Para mim, é a palavra mágica.

Antes de “qualidade”, eu costumo dizer que um texto para o Cronópios precisa ter “qualidades”. Qualidades, assim no plural, significa que um texto criativo não precisa ser bom como o cânone do momento manda, mas deve trazer consigo alguma “vibração”. É muito simples perceber “qualidades” num texto criativo – é como se vibrasse mesmo ou tivesse luz própria, sem depender de iluminação de fora. O texto criativo é “espaçoso”, senta na cadeira e põe os pés na mesa. É assim que editamos o Cronópios, com intuição. Não existe “ciência literária” no nosso caso. Sinto muito.

Sustentabilidade do projeto

O Cronópios é, até aqui, um empreendimento com recursos do próprio bolso. O dinheiro vem das economias e de parte reservada do que ganho com outros trabalhos – sou desenvolvedor web e documentarista. Mas o Cronópios precisa alcançar logo a autossustentação e formar uma pequena equipe permanente de profissionais para fazer o projeto crescer e se consolidar. E já estamos trabalhando nesse sentido – teremos um novo portal com bons espaços para veicular publicidade. Não precisamos cobrar muito por exibição de banner, o objetivo nunca foi ou será ganhar dinheiro, mas alcançar a sustentabilidade do projeto Cronópios. A publicidade por banners é prática antiga, mas acho que será eficiente para nós. Teremos a possibilidade de exibir banners com vídeos de 30 segundos, os mesmos que passam na TV. Teremos de fazer um trabalho duro de conquista de anunciantes, mesmo tendo o Cronópios como ótima vitrine. Eu não quero partir para buscar recursos em órgãos governamentais por meio de leis de incentivo. Participar de editais e essas coisas, nunca mais. Já participamos e sempre outros ganharam.

Jornalismo Cultural

Leio regularmente o Caderno 2 e pouco aproveito. Acho que todas publicações desse tipo estão no piloto automático, são altamente profissionais, e isso não quer dizer que são boas. São periódicos profissionais, nunca vão arriscar ou propor nada de novo. Vamos no feijão com arroz que está tudo bem. Essas revistas de cadernos culturais colocam o leitor e a cultura brasileira também no piloto automático. Por favor, nunca chamem o Cronópios de revista.

As redações estão um pouco robotizadas, produzem bastante mas tudo muito parecido. Praticamente não há diferença de uma revista para outra. Todo mundo é “profissional demais”. Por isso, o que temos é inflação da “mesmice competente”. Por isso no Brasil tem muito espaço ainda para o novo.

Eu não sou mais fã do mundo do impresso, só gostava dele quando não sabia que um dia iria existir algo como a Internet. Não tem comparação, o mundo do impresso é pesado, mecânico e dispendioso, ecologicamente poluente e culturalmente excludente. Não tem futuro. É o mundo da escassez. Nós que estamos na internet estamos no mundo a abundância de informação e meios de expressão, tudo é muito mais barato e eficiente. E estamos sempre cheios de ideias novas, testando tecnologias e nos conectando com pessoas do mundo inteiro. Nós, do lado de cá, somos construtores de espaços e mundos. Participar desse avanço em curso é emocionante demais. Dou graças aos deuses poder viver esse tempo.

Parcerias e Inovação

Sobre as parcerias, estamos sempre abertos para trabalhar junto com outros criadores com projetos bacanas. Já fizemos várias parcerias. Uma bem bacana foi com o pessoal do Teatro para Alguém. Eles visitaram o Cronópios em busca de textos que pudessem ser adaptados para uma peça de teatro de 1 minuto e meio que era transmitida ao vivo pela Internet. Esse projeto volta no ano que vem.

Orgulho

Não sabemos onde vai dar essa nossa empreitada, se duraremos mais alguns anos ou se fecharemos as portas amanhã. Mas os planos são bons, grandes e alcançáveis. Estávamos planejando lançar uma grande atualização do portal ainda este ano. Mas como o projeto do novo Cronópios é bem complexo, decidimos adiar o lançamento para 19 de março de 2011, dia do aniversário de seis anos do Cronópios. O novo Cronópios será um portal mais bem organizado e todo construído com o que se tem de melhor na criação para internet atualmente. Estou muito orgulhoso do que estamos produzindo.

Autor

  • Jornalista formado pela Universidade Santa Cecília. Doutorando e mestre em Ciência da Informação e graduado em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP). Pós-graduando em Filosofia Intercultural pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Especializado em Gestão Cultural pelo Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e Comunicação (Celacc), um núcleo da USP. Como escritor, publicou o romance "As Esferas do Dragão" (Patuá, 2019), e o livro de poesia, ou quase, "*ker-" (Mondru, 2023).

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