Chrono Trigger: O que Sentir pela História?

Chrono Trigger é um jogo de Super Nintendo lançado em 1995, é um role playing game (RPG), e considerado um dos melhores do gênero. Antes de outras explicações de base, é preciso dizer porque estamos tratando de um videogame em uma revista de cultura.

E a resposta para isso começa com: por que não? Levando em consideração somente os RPGs eletrônicos, são complexos em que se envolve uma narrativa elaborada; trilha sonora composta especialmente para o jogo; uma série de personagens com índole e histórico distintos, alguns emblemáticos; e, às vezes, sequências em animação tão bem modeladas quanto as feitas pela Pixar, tão impressionantes em efeito e fascínio quanto filmes de Hollywood. Então, por que não?

Não vou nem aqui nem agora discutir isso a fundo. Fica ai a pergunta, quem quiser deixar objeções, existem os comentários. Adiante.

Um RPG pode ser jogado de diversas formas. A mais antiga se faz com alguns dados e fichas descrevendo as capacidades dos personagens — não precisa de mais do que isso, a não ser imaginação. Com algum controle do resultado dos dados, os jogadores interpretam uma história e reagem aos desafios propostos por um membro do grupo. Nos videogames, perde-se muito dessa interpretação. Mas ainda é uma experiência de narrativa fragmentada, em que dependendo de o quanto você explora os lugares ou conversa com as pessoas, mais ou menos você saberá.

Em Chrono Trigger, como em outros, por exemplo, há ‘missões’ que não precisam ser cumpridas, e há uma série de tarefas de jogo que não possuem uma ordem, e há outras que nem são descobertas se você não partir para a conversa e a interação com os personagens.

Pois bem. O jogo trata de um elemento que pode causar o fim do mundo e os heróis que podem enfrentar essa coisa, como é comum em histórias de fantasia, mas não é isso que nos importa. Quero expor uma característica deste jogo em particular, que é a de — talvez — prover o jogador de uma consciência histórica. Assim: no começo do jogo, há uma festa na sua cidade, pelos quatro séculos passados desde que o seu povo venceu uma batalha contra um mago maligno. Na festa, você poderá conversar (ou não) com um menino, e ele te dirá: ‘grande coisa que vencemos um mago há centenas de anos!’.

Acontece que as aventuras do jogo procedem por viagens no tempo. Portanto, o jogador se verá como protagonista tanto naquela batalha contra aquele mago há quatrocentos anos atrás, quanto em muitas outras. De modo que, quando você voltar àquela festa, no seu tempo, e, por acaso ou vontade, conversar com aquele menino e ele lhe disser o mesmo, você só poderá pensar: ‘garoto, você não sabe do que está falando…’ — porque você esteve lá, sentiu o ambiente da época, o temor das pessoas, a dificuldade da luta em si e a felicidade da vitória, todos os elementos de que só restam ecos indolentes no presente. Isso é o que se pode chamar de consciência histórica.

Daí a aplicar a lição dessa experiência lúdica na realidade, é um passo. Como é que o jogador atento ou que pelo menos se sentisse da forma como eu especifiquei agiria depois, ao pensar na História, nas guerras civis, nas revoluções francesas, nas colonizações inglesas e os homens que as puseram abaixo? O que você sente em relação a todos esses acontecimentos? É certo que estão próximos de significar nada; o que se precisa para evidenciar que havia pessoas que viveram e morreram em tudo o que se passou?

Não sei o que é preciso. Mas caso você queira jogar Chrono Trigger — há outras boas frases e bons pensamentos pra colher — faça o download do emulador e a rom do jogo. Depois diga o que encontrou, pois, como eu disse, podem ser coisas muito diferentes do que eu encontrei.

 

Autor

  • Jornalista formado pela Universidade Santa Cecília. Doutorando e mestre em Ciência da Informação e graduado em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP). Pós-graduando em Filosofia Intercultural pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Especializado em Gestão Cultural pelo Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e Comunicação (Celacc), um núcleo da USP. Como escritor, publicou o romance "As Esferas do Dragão" (Patuá, 2019), e o livro de poesia, ou quase, "*ker-" (Mondru, 2023).

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