Paraísos Artificiais: Do hedonismo à autodestruição

Uma festa rave na cidade holandesa de Amsterdã. Este é o ponto de partida da trama de Paraísos Artificiais, longa nacional com direção de Marcos Prado (do filme Estamira, sua primeira direção) e produção de José Padilha (direção de Tropa de Elite I e II).

Inspirado em clássicos cinematográficos que abordam e almejam interpretar a cultura juvenil de seu tempo (The Doors, de Olive Stone; Réquiem para um Sonho, de Darren Aronofsky; Berlin Calling, de Hannes Stöhr, dentre outros), Paraísos Artificiais certamente aproxima-se de realizar tal feito, compondo uma leitura legítima da juventude pós-revoluções e globalizada da contemporaneidade.

O enredo acontece, sobretudo, em dois tempos principais. No primeiro, conta-se a história do encontro de três jovens brasileiros da classe média Zona Sul carioca em um festival internacional de música eletrônica. Nele, jovens hippies, neo-hippies, hipsters e alternativos “contra-cultura” de todo o mundo vivem momentos extremos de hedonismo, regados a muito sexo, amor, amizade, felicidade, companheirismo, liberdade e satisfação pessoal – numa espécie de continuidade tardia e caricatural da era Woodstock. O trio central da trama é vivido pelos atores: Nathalia Dill (Érika), Luca Bianchi (Nando) e Lívia de Bueno (Lara).

Quase que concomitante a este plano e intercalando-se a ele ao longo do filme, tem-se o segundo tempo que nos mostra os fatos antes e pós-festival que ocorrem na vida daqueles três jovens. É neste momento que essas histórias particulares ganham dimensão dramática, partindo das experiências sensoriais intensas que trouxeram enormes consequências para o resto de suas vidas. Ao mesmo tempo em que as excessivas cenas de sexo e consumo de drogas sintéticas do início nos conduzem a certo estado de ebriedade (igual ao dos participantes do festival), o desenrolar das histórias dos dramas pessoais dos três nos levam a certo estado de estarrecimento e aflição, gerando-nos um olhar crítico e questionador frente a pergunta da possibilidade de efetivação da hedoné grega (ou bem supremo) na vida.

Só então nos damos conta da não superficialidade da trama e do sucesso da equipe realizadora do filme em captar a liquidez, a brevidade acompanhada de exagero, a imprudência e a fugacidade que caracterizam a juventude atual. Sobreviventes em um mundo onde, contraditoriamente, parece que não há mais revoluções a fazer (pois todas já foram feitas?), mas quase nada ou muito pouco mudou, os atos extremos que saturam a primeira metade do filme são, então, justificados em suas causas, efeitos e consequências. Aqui, outra das fontes inspiradoras do diretor, segundo suas próprias palavras, se faz presente: a(s) teoria(s) do sociólogo e filósofo polonês Zigmunt Bauman da liquefação e não-perenidade das instituições e relações sociais na contemporaneidade.

Da recepção do filme, permanecem certas provocações e autoquestionamentos que o diretor Marcos Prado – que já causou polêmica e se destacou no contundente Estamira – e sua equipe conseguem provocar. Se há excessos cometidos pelas exacerbadas cenas de nudez, sexo e consumo de drogas, as mesmas são equilibradas pelo mérito de Paraísos Artificiais não cair nem na apologia leviana, nem no falso moralismo, tão bem caracterizadores das sociedades humanas atuais.

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