Filosofia dos Games

Games têm significado. Podem influenciar nossas vidas e nossa maneira de pensar, podem ter beleza e filosofia profunda

Texto original em inglês The Philosophy of Games.

tradução por Duanne Ribeiro

A falta de uma boa história e personagens é com frequência apontada como uma fraqueza dos videogames quando considerados como forma artística. Embora isso é certamente verdadeiro até certo ponto, acredito que à maioria dos jogos falta algo muito mais importante: significado. Arte não é nada sem significado. As verdadeiramente grandes obras de arte, sejam livros, filmes, música ou pinturas, são aquelas que não só nos entretêm ou nos agradam esteticamente, mas que nos fazem refletir sobre o que é ser humano. Eles nos fazem pensar sobre amor, morte, vida e o universo. É relativamente fácil pensar em um álbum ou um filme que possuem esse tipo de significado e que tiveram um efeito profundo no seu modo de pensar, mas e quanto aos videogames? É tão raro que muitos podem até dizer que isso não é possível.

Eles estariam errados. Há dois jogos que, para mim, exemplificam as possibilidades do videogame como uma forma artística-filósofica. O primeiro é talvez o mais subestimado membro da franquia Zelda: Link’s Awakening. Esta pequena jóia é memorável o suficiente com sua jogabilidade maravilhosa e o charme de funcionar em dispositivos portáteis, mas o que realmente faz dele um clássico é sua profunda e significativa narrativa. Através do jogo, você se esforça para salvar a ilha em que você naufragou de monstros chamados “Nightmares”. A ilha é um mundo que vive e respira, poupado de animais, plantas e pessoas. Você interage completamente com esse mundo, conversando, lutando e até roubando, se assim você desejar.

Você realmente se importa com a ilha e com seu destino. Em um momento bonito, você se senta na praia com Marin, uma garota que se parece com a princesa Zelda. Vocês dois observam o oceano e ela te conta sobre seu sonho de deixar a ilha. Eu me lembro disso como se eu estivesse de verdade naquela praia com Marin. É uma cena mágica. No fim, depois de ter derrotado o último Nightmare, você acorda uma criatura mágica chamada Windfish, cujo ovo é o ponto focal da ilha. O Windfish esteve dormindo durante todo o jogo e o teu objetivo máximo sempre foi encerrar seu sonho. Embora haja algumas pistas, ainda assim é um choque descobrir a verdadeira relação dele com a ilha. A ilha não existe. Ela não era nada além de uma parte de um sonho do Windfish, e de um sonho teu, enquanto o protagonista. As plantas, animais, pessoas, mesmo os monstros não eram reais. Era tudo um sonho bonito e passageiro.

Como esse final melancólico e inteligente é perspicaz, não só em relação a um jogo, mas à vida. O que acontece com as pequenas pessoas digitais no seu aparelho quando você o desliga? Para onde vai aquele mundo, aquele universo? Somos nós próprios apenas um sonho passageiro? O que ocorre quando esse sonho termina? Essas perguntas filosóficas tem um peso ainda maior na medida que você não apenas assistiu à vida de alguém, mas a viveu por si próprio. Você estava lá naquela praia com Marin que já não existe, ou talvez nunca tenha existido. Esse jogo, sem o uso de gráficos impressionantes e roteiros complexos, me fez pensar. Isso é especial de fato.

O segundo jogo que adentra as dimensões da filosofia é recente: The World Ends With You. A história começa com a morte de Neko, o protagonista, no início metafórica, depois literalmente. Neko vive na Tokyo dos dias de hoje, uma alma perdida no anonimato alvoraçado e apressado da cidade. Ele usa seus fones de ouvido, perversamente satisfazendo seu desejo de se desligar do mundo e de sua dor. Conforme a história prossegue, Neko conhece outros fantasmas e relutantemente faz conexões com eles para escapar do limbo em que está aprisionado. Os laços formados com esses personagens faz com que você realmente se importe com eles. Devagar, Neko e, em consequência, você, querem se conectar. O mero ato de jogar leva você e ele a se empenhar para retornar à vida, para se reunir ao mundo.

A transformação de Neko está completa quando no encerramento ele retira seus fones e os atira em direção ao limpo céu azul. O próprio título do jogo é modificado — de The World Ends With You para The World Begins With You. Que bonita, poética formulação da vida moderna. Quantas vezes não nos isolamos do mundo, quando uma infinita gama de possibilidades nos espera? Tendo sido eu próprio alguém como Neko, esse final me emocionou profundamente.

Portanto, videogames têm significado. Eles podem influenciar nossas vidas e nossa maneira de pensar. Eles podem ter beleza e filosofia profunda. Eles podem ser muito mais. Eu espero que no futuro mais lançamentos sigam esses outros dois e ofereçam experiências mais intensas e significativas.

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