O soco que só quer atingir a cara de quem é fraco

imagem: capa do jornal Extra

Bolsonaro falar que tem vontade de dar um soco na boca de um jornalista evidencia mais uma vez a diferença entre classe empresarial e classe trabalhadora e define de qual lado o presidente está.

Ele jamais ousaria falar em dar um soco na boca de alguém das famílias Marinho ou Civita. Ele nunca direciona a sua fúria contra empresários do ramo de comunicação e imprensa. Ele não tem essa coragem. Bolsonaro a direciona contra o repórter de rua, o sopé da indústria de jornalismo.

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Ao mesmo tempo, sua atitude mascara o funcionamento das ferramentas de poder. Ele ataca ou o jornalista ou as pessoas jurídicas, jamais as famílias empresariais que detêm os grandes grupos. Ele oferece aos súditos o espetáculo fantasioso que dele é esperado — uma agressividade que não passa da velha estrutura em que poderosos se voltam contra os mais fracos. Mas jamais vai voltar suas baterias contra quem detém o poder de definir a pauta, contra quem de fato lucra com a mídia.

Em um período de forte polarização política no país, a relação entre sociedade, grupos de poder e imprensa se torna palco para uma guerra midiática. Os meios de comunicação são um ator na luta pelo poder no país e — gostemos ou não — conseguir conquistá-los ou derrubá-los faz parte da batalha.

Bolsonaro se fortalece por meio de discursos que o colocam como combatente de diversos inimigos. Essa é uma estratégia bem antiga da política, e até hoje eficiente: oferecer à população um inimigo e se colocar como o herói que irá derrotá-lo.

Os inimigos que Bolsonaro alavanca são vários: a esquerda, o PT, o globalismo, o kit gay, o MST, Cuba, Venezuela e a imprensa. O episódio do soco foi apenas uma tentativa de se esquivar de uma pergunta inconveniente, redirecionando a fúria dos súditos contra quem pergunta, colando nele o cartaz de inimigo. Se assemelha aos “dois minutos de ódio” do 1984, de George Orwell.

Entretanto, ao contrário do que os súditos esperam, o ataque do Bolsonaro é mais simbólico do que prático. Suas ações não afetam o poderio econômico dos grupos detentores da mídia. Elas afetam, de um lado, os profissionais que estão nas ruas a trabalho e, de outro, o direito primordial de liberdade de expressão, sem contar que em uma democracia os representantes eleitos têm obrigação de se explicar à população, uma responsabilidade da qual Bolsonaro se furtou com sua atitude agressiva.

Se um veículo de comunicação vai se posicionar a favor ou contra um presidente ou grupo político, essa decisão não compete ao jornalista da base da pirâmide. Compete aos grupos mais altos da hierarquia da empresa. Se um jornalista agir contra aquilo que a empresa decidiu ideologicamente, o olho da rua é um caminho simplório.

Jornalistas são empregados descartáveis. Sai um, entra outro. A fila de diplomados atrás de emprego é grande. Um jornalista pode ser ameaçado, ter problemas de estresse ou até sofrer agressão física. Outro vai entrar em seu lugar.

Já a estrutura de poder é permanente. Essa vai passar intacta. Um Vladimir Herzog é facilmente morto pelo poder. Um Roberto Marinho, não.

Bolsonaro mostra que no fim das contas é um ser humano pequeno, que nunca vai conseguir se posicionar contra poderosos, apesar de montar um espetáculo teatral para fingir para os súditos que é “sujeito homem”.

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