Guia para Avaliar Debates Eleitorais

Campanha lançada em 2008

Estamos em época de eleições. Candidatos vão a público defender suas propostas e pedir nosso voto. É o momento do cidadão aplicar seu espírito democrático (o ideal seria que estivesse ativo durante os anos entre os pleitos também, né…) e ao menos nesse momento buscar fazer uma boa escolha.

O foco costuma estar sempre nos grandes cargos executivos. Não custa lembrar que é muito mais importante e impactante escolher bem e fazer uma divulgação de bons candidatos no legislativo – de fato no nosso sistema político o congresso acaba tendo mais poder e impactando mais do que o presidente, que pode ficar de mãos atadas com um congresso ruim. Por isso é importantíssimo pesquisar bem seus deputados. Dito isso, a ênfase desse texto é sobre a escolha dos presidentes, que são quem fica com os holofotes.

Os presidentes fazem sempre debates para discutir as ideias e se fazerem conhecer pelo público. As emissoras de tevê ajudam, organizando os eventos. O nosso papel como eleitores (lembre-se, espírito democrático) é assistir e nos esforçarmos para avaliar a melhor escolha. Nem sempre é óbvio para todos como fazer isso, então oferecemos para vocês esse pequeno guia prático para orientar a avaliação.

Primeiramente quero fazer um apelo para que façamos um exercício sincero de avaliar o candidato com rigor. Avaliem os critérios que vocês estão usando para aprovar ou reprovar os argumentos do seu candidato. É muito comum no debate político que os candidatos usem argumentos que não são exatamente válidos. E é muito compreensível que você goste do seu candidato e não perceba esses erros dele. Mesmo que você sinta que seu candidato é bom, tente ter uma postura crítica e avaliar se ao menos nesse momento ele está se saindo bem. Mantenha a atenção no argumento, ao menos nesse nosso pequeno exercício do espírito democrático.

Erros Argumentativos Comuns

São variados os tipos de erro argumentativo em que um candidato pode incorrer. Separamos uma listinha de algumas mancadas que parecem ser mais recorrentes nesse tipo de debate, para ficarem espertos:

Desviar do tema
É muito importante que o candidato esteja preparado para responder à pergunta feita. Se insistentemente ele se desvia do tema (isso geralmente é apontado pelos adversários ou entrevistadores) isso mostra que ele não sabe responder.

O desvio do tema pode ser feito de vários outros modos. Pode-se, por exemplo, ao responder o adversário focar-se em um aspecto menos relevante do argumento e ignorar o ponto principal. Ou mesmo responder com algum ataque ao outro candidato, como quando ao ser questionado sobre um assunto qualquer responder apenas que o candidato que o questiona é imoral, corrupto, extremista etc.

Dados falsos
Em um debate ao vivo é muito difícil, no ritmo rápido de várias perguntas, conferir se todos os dados apresentados estão corretos. Candidatos podem abusar disso e citar dados incorretos para o seu argumento. Mas, gente, estamos na era digital, você assiste ao debate com o smartphone na mão. Confiram no Google se as informações dadas são verdadeiras. Mas não confiem num site só, procurem ver se há um consenso, e veja a versão dos fatos dada pelos opositores, se eles possuem bons argumentos e fontes para sustentar o contrário.

Evidência anedótica
Já que falamos de dados, vamos lembrar o que não é um dado. Um dado não é simplesmente algo que contaram, algo que ouviu dizer. Isso é uma anedota. Nada contra, todo mundo conta histórias, mas é importante lembrar que isso não é um argumento. Dizer coisas como “falei do assunto com muitos especialistas e comprovei”, ou “não ouvi falar de ninguém que não gostou de tal medida”, ou “isso já deu certo em muitos lugares”, isso tudo não está corretamente embasado. São só anedotas e cada um está livre para simplesmente não acreditar.

Tu quoque
Uma falácia argumentativa muito comum. O termo latino significa “você também”. É a falácia quando o candidato, ao ser questionado sobre alguma falha, aponta que o adversário possui a falha também. Por exemplo, questionado se cometeu uma irregularidade, ele responde “mas o partido tal fez pior e ninguém fala disso”. Não é o erro dos outros que está em questão. Um erro não justifica o outro.

Falácia genética
Genética é no sentido de “origem”. Este é o erro argumentativo em que se avalia uma ideia do oponente julgando a sua origem e não o argumento em si. Por exemplo, alguém de direita critica algum argumento social dizendo que “quem defende isso é comunista”, ou alguém de esquerda diz que determinada medida econômica “é inventada por autores neoliberais”.

Mas a origem da ideia não é importante, e sim o seu valor como argumento. Espera-se que o candidato seja capaz de responder ao argumento, independente da sua origem. Ora, se a ideia fosse tão fraca e só fosse defendida por simpatia ideológica (pela pessoa estar próxima ao grupo de origem do argumento), então seria muito fácil argumentar contra ela diretamente em vez de usar essa falácia.

***

Então, é isso povo. Prestem atenção se tem bons motivos para comemorar o desempenho do seu candidato, ou se torceu por ele só pela simpatia que já tem. Nada de comemorar vitória só porque ele falou umas frases de efeito. Vamos contribuir para melhorar o nível do debate político.

Autor

  • Bacharel em filosofia, largou um mestrado em filosofia da ciência. Teve formação bem tradicional, mas fugiu para a filosofia analítica. Possui interesse em diversas áreas filosóficas, questões políticas, sociais. Entusiasta da ciência no geral, da economia, e do bom diálogo aberto e democrático com o diferente. Atualmente, está mudando de área de atuação, estudando programação e tentando escrever romances no tempo livre.

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