Precisamos parar de falar do Bolsonaro

Não existe publicidade negativa

Cerca de dez anos atrás ocorreu um fenômeno relativamente novo nas redes sociais: um diálogo entre uma cliente e o atendimento de uma loja virtual viralizou causando indignação nos quatro cantos da internet. A imagem era um print do diálogo entre a cliente, reclamando de um produto e o atendente sendo completamente desrespeitoso e sarcástico.

Normalmente as pessoas tendem a achar que esse tipo de “crise de imagem” tende a sair caro para a empresa, afinal um post que teve milhares de compartilhamentos e comentários explicitando qual era a loja e mostrando o péssimo atendimento deveria ter a potência de uma bomba. E teve, só que aconteceu o contrário, a loja quintuplicou seu faturamento nos meses posteriores.

Esse é o primeiro caso de que eu me lembro, depois vieram muitos outros e a todos acompanhei bem de perto para ver qual seria o efeito, percebi que quando era uma loja muito grande quase não tinha diferença, mas quando eram lojas menores e desconhecidas da maior parte da população elas tiveram um boom de crescimento.

Falem bem ou falem mal, mas falem de mim

Sempre dizem no meio publicitário que não existe “publicidade negativa” e eles estão certos. O rage marketing é usado propositalmente para alavancar o conhecimento de marcas novas. A empresa cria uma campanha politicamente incorreta, normalmente contra minorias, depois de publicado alguém faz um post indignado sobre aquilo em algum grupo ou página que defenda a minoria que foi ofendida e pronto.

O resultado você já imaginam, a problematização se alastra, a loja ganha milhões em mídia gratuita, depois pede desculpa e ganha mais mídia gratuita e nos meses seguintes começam a lucrar muito mais.

As subcelebridades e youtubers entenderam esse mecanismo publicitário e muitos investiram pesado em um discurso de ódio e anti-minoria para subir nos degraus da fama. E deu muito certo, não preciso nem citar nomes, vocês sabem muito bem quem está ganhado muita popularidade e dinheiro com discurso de ódio por aí.

Devemos lembrar que, para as pessoas que estão dispostas a usar o “marketing de ódio”, não importa se elas também recebem ódio, esse é apenas um dano colateral, o que importa é a mídia gratuita, são os milhares de cliques a mais que vão gerar dinheiro e fama. Não importa que goste ou não goste, mas que conheça.

Usando o Marketing de Ódio para benefício próprio

O que começou por acaso acabou se tornando uma das melhores estratégias de marketing deste milênio, e a política não ficou de fora dessa. Foi assim que em 2016, um personagem até então completamente desconhecido no resto do mundo, e visto apenas como uma celebridade de segunda categoria nos EUA, se tornou conhecido em todo planeta em apenas alguns meses.

O mais interessante é que parecia que ninguém gostava dele. A mídia só mostrava sua parte grotesca, dia após dia, e o próprio Trump não perdia a chance de cometer uma “gafe” ou disparar algum ataque a minorias ou falar algo tido como politicamente incorreto. Ele não se importava com a avalanche de críticas vindas de toda parte, o que ele queria ele estava conseguindo: alcance.

O que importa no marketing de ódio é que você seja visto pelo maior número possível de pessoas — e você usa o ódio do outro para fazer isso. Ao se deparar com uma campanha machista, perceba que, normalmente, são as feministas, completamente indignadas com a propaganda, que vão dar visibilidade a propaganda e à marca, mesmo que seja com mensagens de indignação e que tenha como intenção “sujar o nome da marca”. Com questões de cunho racial o modus operandi é parecido, ativistas anti-racismo são os que dão mais visibilidade a propagandas racistas. O mesmo acontece com a questão homofóbica, normalmente tomamos conhecimento de uma propagando homofóbica pois os grupos anti-homofobia são os que compartilham.

Esse o nível de manipulação publicitária, eles usam exatamente as pessoas que se sentem ofendidas como mídia gratuita para alcançar o sucesso. Se você ainda duvida da força dessa forma asquerosa de marketing, lembre-se de quem ocupa hoje a Casa Branca.

O segredo é não espalhar

No fim das contas as pessoas que se sentem ofendidas com as estratégias de rage marketing são as que mais compartilham e, portanto, os maiores agentes publicitários que se poderia conseguir. E não se engane: é ingenuidade achar que os eleitores dos Bolsonaros mudariam de voto depois de ver as suas inúmeras gafes e os seus discursos de ódio — muito pelo contrário, para eles, quanto mais melhor.

Portanto, quando eu vejo dezenas de páginas de esquerda estampando a cara do Bolsonaro todo santo dia em minha timeline eu fico decepcionado, são exatamente eles que fazem o melhor marketing para esse “político”, não só porque eles continuam compartilhando as atrocidades desse personagem, mas por que atiçam seus seguidores a fazerem o mesmo e assim dão um alcance gigante a um personagem que em outros tempos mal seria percebido.

Quer lutar contra bolsonaros e bolsominions? Pare de falar sobre eles, eles se alimentam de atenção, principalmente da atenção ruim, e não se iluda achando que ao jogar a “verdade” na cara dos seguidores do “messias” eles vão mudar de opinião, não vão, eles são incapazes de fazer uma autocrítica, eles vão é apoiar ainda mais seu “salvador” e o tiro vai sair pela culatra.

Autor

  • Formado em jornalismo, sempre trabalhou com programação. Depois, se especializou em marketing e agora está mais focado na disseminação da magia do caos e da filosofia zen.

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