Poesia e cultura eternizadas

Parceiros em composições e na boemia, Noel Rosa e Aracy de Almeida são eternizados em filme e peças de teatro

“Com que roupa” Aracy de Almeida e Noel Rosa chegam até nós? Quem veste seus personagens para revivê-los, e assim eternizar suas obras? Carol Bezerra e Rafael Raposo aceitaram esse desafio. Os atores vivem Aracy de Almeida e Noel Rosa no filme Noel: Poeta da Vila, gravado em 2004, do diretor Ricardo van Steen.

Foi dessa experiência que eles descobriram os segredos, a vida e os valores de artistas que representam para a MPB muito mais do que a mídia atual permite revelar.

Aracy de Almeida ficou conhecida como jurada de um programa de calouros pelo seu famoso jargão “Vou dar dez pau” e seu estilo, digamos, diferente de se vestir. Poucos sabem, no entanto, que nos anos 30 ela conquistou seu espaço e se tornou, ao lado de Carmem Miranda, a maior cantora de sua época.

Araca — como era conhecida — começou sua carreira cantando numa igreja do subúrbio do Rio de Janeiro, dona de talento ímpar, logo chegou às rádios. Aracy foi companheira, amiga e principal intérprete de Noel Rosa.

Já Noel Rosa escreveu quase mil poemas e teve 259 músicas gravadas. Em suas mãos tudo transformava-se em poesia e música. Além de Aracy, Cartola, Ismael Silva e Lamartine Babo foram os principais companheiros de composição e de boemia. Ganhou reconhecimento quando fez Com que Roupa, regravada por vários cantores de décadas posteriores.

Reviver Aracy de Almeida e Noel Rosa foi um desafio irrecusável. Para “vestir” os personagens da forma mais natural e real possível Carol e Rafael mergulharam nas biografias e obras.

Depois do filme, que ficou em cartaz nas principais capitais do Brasil, Carol montou o show chamado Aracy de Samba e de Almeida, com seu grupo de músicos Chora que Passa — criado por ela para apresentar temas de resgate da música da década de 30 com performances teatrais.

Quando chamado para o papel, Rafael Raposo mergulhou de corpo e alma no personagem. “Eu o quis mesmo e, para isso, perdi o pudor e me tornei Noel”, conta. O ator se identificou com a coragem de Noel Rosa em ser um artista, nato, de fazer o que gosta e com paixão. “Somos e seremos sempre dois artistas na essência, nunca eu — e também ele — vamos atrás do sucesso, mas sim de fazer o que motiva a arte”, conta Rafael.

A dedicação os levou a essência não só dos personagens, mas de Aracy e Noel Rosa como pessoas e artistas. Carol buscou “ficar mais com o que Aracy quis dizer do que com o que ela pode parecer”. Para Rafael Raposo, a identificação foi ainda mais profunda, pois “aprendi a dar valor à vida, a olhar para as pessoas sem me importar quem são”.

O filme foi somente uma porta de entrada para que “Araca” e Noel fossem relembrados e valorizados. É importante destacar que o samba ganhou força e personalidade com eles e a partir deles.

Carol Bezerra pretende levar à diante seu projeto que traz Aracy de Almeida de volta aos palcos. Ela já fez várias apresentações, entre elas no Teatro Municipal de São Paulo e no Sesc Ginásio no Rio de Janeiro. Nos próximo dias 20 e 27 de maio, Aracy de Samba e de Almeida estará no Centro Cultural Carioca. Mas ela quer ir além. “Enquanto tiver fôlego, não vou parar de produzir esta apresentação, quero mostrar essa Aracy, diva do Maxixe e do Samba, para que as pessoas saibam que ela não foi só jurada mal-humorada dos programas de calouros”, explica.

Carol Bezerra já interpretou outros artistas marcantes da MPB como Aracy Cortes, Heloísa Helena, Gilberto Gil e Elizeth Cardoso, que ainda veste a atriz no musical Tom & Vinícius, em cartaz no Rio de Janeiro. “Pretendo fazer outras personalidades marcantes, mas não quero parar de interpretar Aracy”, conta.

Se estivesse vivo, Noel completaria 100 anos no próximo ano. Rafael Raposo já analisa novas propostas de trabalho para homenageá-lo. No próximo carnaval ele estará no carro abre-alas da Vila Isabel, que contará em samba a história do compositor patrono da escola.

Mesmo não sendo cantor, ele estuda um convite para gravar um CD com as canções de Noel. “Estas coisas que surgem não são pensadas, não vem de mim, acontecem naturalmente”, explica Raposo que, em breve, viverá no teatro outra legenda, Oscarito considerado um dos pais do humor no país. “Um dia quero também “vestir” Chaplin”, confessa o ator.

Se depender de Carol Bezerra e Rafael Raposo, Aracy de Almeida e Noel Rosa já estão eternizados em suas vestimentas artísticas. Aracy está ainda mais viva na pele da atriz, fazendo o que gosta, que é cantar e interpretar canções de Noel Rosa. Este felizmente mantém espaço na nossa cultura, com regravações de muitos cantores da nova geração da MPB. Sobre isso, Noel afirma na pele de Rafael Raposo: “respeito é bom e eu gosto”.

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